É impossível analisar os problemas do mau uso do vale-transporte por parte do empregado em suas linhas gerais – declaração de endereço falso, endereço propositalmente desatualizado, empréstimo do cartão, venda dos créditos, trajeto de ida e vinda ao trabalho feito de carona ou com veículo próprio etc. – sem analisar também o vezo disciplinar que a questão exige. O que é comum de se ver, no entanto, são empregadores que não sabem como agir diante dos problemas e preferem fingir que não sabem que boa parte dos vales-transporte cujo preço custeiam em até 94% está indo pelo ralo na mão de alguns maus empregados que nem se dão conta de que podem ser demitidos por justa causa.
Ao fingirem não ver o problema, na prática perdoam os faltosos e o ciclo continua.
O regramento geral do Vale-Transporte, imposto em 1985 pela Lei nº 7.418/85 e regulamentado pelo Decreto nº 95.247/87, é bastante simples, claro e eficaz, o que não é comum de encontrar no complexo cipoal normativo nacional. Ali se encontram perfeitamente delimitados os direitos e deveres de empregador e empregado no que diz respeito ao transporte entre a residência e o trabalho e vice-versa, desde a aquisição deste benefício pelo empregador até a forma de participação de ambos em seu custeio, passando pelo compromisso que os empregados têm de assumir para exercer seu direito ao uso: informar corretamente os endereços, os meios mais adequados para ir para o trabalho e voltar para casa, atualizar anualmente estas informações e usar o vale apenas para o fim determinado em lei.
Tudo quanto desvie destas premissas, inclusive fazer declaração falsa, é “uso indevido de vale-transporte” e, nesta condição, é caracterizado como falta grave. Falta grave, como se sabe, é conduta que, a exemplo das alíneas de “a” a “l” do art. 482 da CLT, podem redundar em rescisão do contrato por justa causa.
O empregador deveria controlar, por exemplo, os créditos de vales-transporte que, contrariando o cálculo inicial, sobram para alguns empregados ao final do mês. Eles tanto podem significar fatos prosaicos que não revelam problema algum de conduta, como faltas ou afastamentos, o uso de uma carona, o uso de veículo próprio quando se perde o ônibus, como sinalizar mau uso puro e simples, como mudar de endereço e não comunicar que não precisa mais de vale-transporte, uso constante e corriqueiro de outro meio que não o transporte público para ir ao trabalho e dele retornar etc.
A ausência de créditos no final do mês também pode significar mau uso quando se sabe que o empregado se utiliza de veículo próprio, ou vem sempre de carona, razão por que o empregador deve também estar atento: se o empregado usa veículo próprio mas não tem crédito ao final do período, pode significar que está emprestando cartão para que terceiros os gastem, ou a conversão dos créditos em dinheiro ou combustível etc.
O fato é que tomar conhecimento dos desvios de finalidade, das informações falsas – uso indevido, enfim – e não tomar providências significa perdoar os abusos.
As condutas devem ser coibidas, senão com rescisão do contrato por justa causa logo na primeira vez – que o empregador pode achar muito severo, mas tem direito de fazê-lo – ao menos com advertências verbais e escritas, suspensões, suspensões agravadas e, quando nada der resultado, com rescisão por justa causa, não só por ato de improbidade (alínea “a” do art. 482 da CLT), mas também, e especificamente, por uso indevido de vale transporte (conduta prevista no § 3º do art. 7º do Decreto nº 95.247/87).
Com uma coisa o empregador pode contar: basta começar a sinalizar o enrijecimento da administração no trato com a questão que os abusos ou se resolvem ou se reduzem ao mínimo possível.
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